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O PREÇO DO DESCASO

Como noticiado em todos os sites de noticias nacionais, e em muitos internacionais, uma barragem da empresa Vale rompeu em Brumadinho (MG), no dia 25 de janeiro de 2019. Surpreendentemente, o ocorrido em Brumadinho superou em intensidade o desastre em Mariana, no mesmo estado, em 2015. Infelizmente, em questão de 4 anos, o Brasil estampa as manchetes dos principais noticiários do mundo com adversidades ambientais de grande intensidade - um país privilegiado por não estar em zonas de impacto tectônico, não correr riscos iminentes de ser atingido por furacões e não ter vulcões ativos. Visto isso, só há uma conclusão: Não se trata de um desastre natural, mas de um crime humano.

A Mina de Córrego do Feijão, onde está localizada uma das 7 barragens que se rompeu em Brumadinho, produziu em 2018 8,5 milhões de toneladas de minério de ferro, que é equivalente a 2% da produção de minério de ferro da mineradora Vale. A mina faz parte do Complexo de Paraopeba, que em 2018 a produção foi de equivalente a 27,3 milhões de toneladas, correspondendo à aproximadamente 7% da produção da Vale. O complexo é constituído de 13 estruturas utilizadas para disposição de rejeitos, retenção de sedimentos, regulação de vazão e captação de água. Além das barragens, a Mina Córrego do Feijão apresentava várias estruturas administrativas e de apoio, como centro administrativo, refeitório e oficinas de manutenção, além de terminal de carregamento e pequena malha ferroviária para escoamento do minério de ferro.

A tragédia, que até aqui já matou 65 pessoas -além de 279 desaparecidos - tem muitos traços de descaso e irresponsabilidade. Vamos à alguns fatos:


01-) Desde 2014, o Brasil passa por uma intensa crise econômica e política. No governo, muitas instituições entraram em profunda desestabilização, fato que enfraqueceu a ação de diversos órgãos e empresas. No setor ambiental, a situação se complicou demais, visto que sofreu com cortes de verbas para estudos, investimentos, fiscalização e prevenção de desastres, tanto a nível federal como também a nível estadual. De 2013 a 2018, o orçamento do Ministério do Meio Ambiente caiu mais de 1,3 bilhão de reais, uma pasta que, historicamente, já tinha um orçamento bastante inferior se comparado a outros ministérios. A situação do departamento encarregado de vistoriar as mineradoras situadas no estado de Minas Gerais, à época do desastre de Mariana, em novembro de 2015, era de uma perspectiva de perder mais 40% dos servidores nos dois anos seguintes. Especialistas afirmam que o Brasil sofre com uma estrutura deficiente dos órgãos reguladores e brechas na regulação estimulam a impunidade.


02-) Politicamente, a situação também é caótica: Após o ocorrido em Mariana, em 2015, foi desenvolvido e apresentado na Assembleia Legislativa de Minas Gerais um projeto que visava endurecer as regras para as barragens, que, não recebendo apoio, não avançou para aprovação. Além disso, também após Mariana, tramitou no congresso nacional diversas ações visando punir os culpados e evitar novas tragédias: instalou-se comissões sobre o assunto, parlamentares visitaram o local e pensou-se em alterações legislativas. A Comissão Temporária da Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) até chegou a desenvolver um projeto de lei que aperfeiçoa as normas sobre os rejeitos e endurece as sanções a infratores. Entretanto, todas essas ações serviram apenas como um início de reação à tragédia, devido à indignação e à pressão da sociedade por punições; nenhum projeto foi aprovado.


03-) A Vale também arriscou. Em Brumadinho, a empresa usava uma tecnologia de construção bastante comum nos projetos de mineração: O método chamado de alteamento a montante, utilizado tanto no reservatório I da Mina Córrego do Feijão da Vale como na barragem de Fundão da Samarco, em Mariana, que rompeu em 2015, permite que o dique inicial seja ampliado para cima quando a barragem fica cheia, utilizando o próprio rejeito do processo de beneficiamento do minério como fundação da barreira de contenção. Essa forma de funcionamento é considerada por especialistas da área como a que possui menos segurança, sendo também a mais barata.


É fácil perceber, portanto, que não se trata de uma fatalidade. Diversas atitudes que deveriam ter sido tomadas para evitar a reincidência desse tipo de tragédia não foram praticadas. O Brasil como um todo perde, tanto humanamente como ambientalmente: inúmeros animais form mortos; a lama - que contém restos de minério, sílica e derivados de amônia, visto que é o resultado da separação do minério de ferro bruto das impurezas - no rio Paraopeba praticamente impossibilita a vida aquática.Parte da flora da mata atlântica também está sendo afetada.



Felizmente, os responsáveis começaram a ser punidos: dois engenheiros que atestaram a estabilidade da barragem e três funcionários da Vale responsáveis pelo seu licenciamento foram presos. A esperança é que o país tenha aprendido pelo erro de não ter agido no momento em que deveria; tomara que ações políticas sejam tomadas e que as punições sejam rígidas. Ainda mais intensamente, espero que não tenhamos que escrever brevemente sobre outro museu incendiado, ou outro prédio desabado; que o Brasil passe a evitar tragédias, e não apenas tentar curá-las.








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